Por conta do aquecimento global, a América do Norte poderá ser atingida por doenças infecciosas transmitidas por insetos, pela água ou pela alimentação em um futuro próximo. Três pesquisadores do Instituto de Pesquisas do Hospital para Crianças de Toronto (Canadá), Amy Greer, Victoria Ng e David Fisman, descreveram as conseqüências do aumento previsível da temperatura e das precipitações num artigo editado pela publicação especializada "Canadian Medical Association Journal". Segundo eles, moléstias como a doença de Lyme, a febre de vírus West Nile, a chikungunya, além da cólera, dos surtos de diarréias e de infecções respiratórias, poderão aparecer ou estender-se por uma área que vai do sul dos Estados Unidos até o Ártico.
As relações estreitas entre o clima, o meio ambiente e as doenças infecciosas nos países em desenvolvimento, como a Índia ou alguns Estados da África Subsaariana, já foram descritas com precisão. Já nos países desenvolvidos, onde as condições sócio-econômicas e a exposição a insetos vetores de doenças são nitidamente diferentes, as conseqüências sanitárias da alteração climática serão provavelmente menos agudas, porém bem reais.
"As moléstias transmitidas pela água continuam surgindo, apesar das sofisticadas tecnologias de tratamento de água que foram implantadas", sublinham Amy Greer e seus colegas, lembrando várias epidemias que ocorreram recentemente na América do Norte. "As epidemias de doenças transmitidas pela água foram vinculadas por especialistas a episódios de precipitações extremas, e elas deverão se intensificar no decorrer das próximas décadas", escrevem. "Além disso, a maior parte das gastrenterites, em particular aquelas provocadas pelas bactérias campylobacter e salmonela, vêm seguindo nitidamente um modelo de ocorrência estival". Os pesquisadores também avaliam que a elevação das temperaturas tornaria provável um aumento das ocorrências das moléstias transmitidas pela água e a alimentação.
As incidências das infecções pulmonares provocadas por agentes transmitidos pela água serão muito provavelmente amplificadas, tanto na sua virulência quanto no crescimento da sua área de atuação, pelas modificações do clima. Este deverá ser o caso da legionelose, cuja "incidência culmina durante os meses mais quentes, enquanto os riscos (de ocorrências) aumentam quando o clima se torna chuvoso e úmido", relatam Amy Greer e seus colegas. Em sua opinião, "a moléstia digestiva transmitida pela água que apresenta as maiores condições de se intensificar como resposta à alteração climática mundial é a cólera", cuja manifestação "poderia aumentar consideravelmente".
O artigo aborda igualmente os transtornos que deverão se produzir na ecologia de certas micoses cuja presença endêmica poderia se estender, ampliando o seu raio de ação. "Os verões secos e as precipitações invernais importantes que estão sendo previstas para a América do Norte preenchem as condições ideais para a disseminação do Blastomyces dermatitidis, um champignon responsável por moléstias dos ossos, dos pulmões e da pele", indicam como exemplo os autores.
O artigo descreve também as modificações que dizem respeito às moléstias transmitidas por insetos. Assim, eles prevêem a extensão para as províncias canadenses do Alberta e do Saskatchewan das áreas onde se propagam os carrapatos, que são vetores, entre outras, da doença de Lyme. Além do mais, um advento mais precoce da primavera teria por efeito um aumento do número dos casos humanos de infecção pelo vírus West Nile. Em contrapartida, os pesquisadores prevêem uma atenuação do impacto das epidemias de gripe sazonal e avaliam como sendo "imprecisos" os riscos de reinstalação da malária nos Estados Unidos e no Canadá.
Os autores insistem na gravidade da ameaça que esta evolução pejorativa faria pesar sobre as populações que vivem nas regiões árticas, que já estão desfavorecidas neste campo. Em sua conclusão, eles fazem um apelo para que seja reforçado o dispositivo de vigilância das moléstias suscetíveis de se intensificarem no futuro.
Tradução: Jean-Yves de Neufville
Fonte: www.lemonde.fr
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