Uma nuvem imunda de poeira. Muita sujeira acumulada e até ratos mortos. Imagens assim foram gravadas dentro de tubos de ar-condicionado em prédios públicos e particulares de São Paulo, por onde passam dezenas de milhares de pessoas diariamente.
Foi tudo registrado por um robozinho, que tem uma câmera acoplada e também uma espécie de escova. “A filmagem é feita em tempo real. Enquanto o robô está fazendo a limpeza, o operador acompanha esse serviço. Em curvas, onde a velocidade do ar é menor, fica mais sujeira”, explica Leonardo Cozac, diretor da Associação Brasileira de Ar-Condicionado.
O robô é fabricado no Brasil e já descobriu problemas no ar-condicionado de grandes aeroportos e hospitais. “As partículas em suspensão vão ser respiradas pelas pessoas que estão no ambiente. Todo o ar que passa pela rede de dutos está indo para o ambiente e as pessoas estão respirando esse ar”, afirma Cozac.
Todo ar-condicionado funciona de um jeito parecido: capta o ar do ambiente e força a passagem dele por um filtro. Serpentinas fazem o resfriamento. Nos prédios onde o sistema é compartilhado, um ventilador potente lança o ar frio pelos dutos.
Além do filtro, uma peça fundamental é a bandeja. Ela recebe as gotas de água que se formam quando o ar é resfriado. Na bandeja é que mora o perigo. “Esse sistema pode acumular água e, consequentemente, pode desenvolver microorganismos como fungos e bactérias. Através do ventilador, essa contaminação pode ser conduzida para o ambiente”, aponta Cozac.
No laboratório, a ameaça fica visível. Amostras de ar recolhidas em ambientes climatizados reuniram uma quantidade grande de fungos e bactérias.
“Os microorganismos, de um modo geral, são considerados potencialmente causadores de doenças. Vai depender do seu sistema imunológico”, esclarece a microbiologista Maria José Silveira.
Ou seja, bichinhos invisíveis, que poderiam ser inofensivos, atacam com tudo, se as defesas da pessoa estiverem enfraquecidas. “Normalmente, dá problemas alérgicos”, opina uma mulher.
“Dá rinite, dor de cabeça”, complementa outra.
“A maioria das pessoas reclama do ar condicionado”, conclui um homem.
“A bactéria mais comum no ar-condicionado, a causadora de doenças, tipo pneumonia, a gente sabe hoje que é a Legionella pneumophila”, afirma a microbiologista.
Segundo os médicos, foi essa bactéria de nome complicado, a Legionella pneumophila, que contaminou, no fim de dezembro passado, a nutricionista Aline Borges, de 23 anos. Diabética, a mineira de Belo Horizonte sofreu uma infecção generalizada e teve amputados os dedos dos pés e as pontas dos dedos das mãos.
“A gente chegou a acreditar que íamos perdê-la”, conta o pai de Aline, Márcio Borges.
“Hoje, a Aline está consciente, o que é um pouco mais tranquilizador”, afirma o médico Rogério Pereira.
Ao Fantástico, o pai de Aline contou que ela viajava muito a trabalho, que passava horas e horas no ar-condicionado. “Nesse último semestre, foram 22 cidades por que ela passou. Nessas cidades, quase todos os hotéis tinham ar-condicionado. Ela dormia com ar condicionado”, ele avalia.
Em 1998, o então ministro das Comunicações Sérgio Mota também contraiu a bactéria e morreu. Desde 2003, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou uma série de normas para ar-condicionado de uso coletivo. Filtros e bandejas devem ser limpos todo mês. O ventilador, de seis em seis meses.
“A legislação, no Brasil, é muito boa. Porém, a fiscalização, em alguns locais, falha”, destaca Cozac.
O diretor da Associação Brasileira de Ar-Condicionado aponta outra falha grave: “Falta uma norma específica para hospitais. Já saiu em consulta pública, houve audiências, porém não foi publicada ainda”.
Imagens foram feitas pelo robozinho em tubos de ar condicionado em um dos maiores hospitais do Hemisfério Sul, mas os médicos dizem que não há motivo para pânico, mesmo com relação à bactéria que contaminou a nutricionista mineira.
“O importante é a população saber que é uma infecção rara”, alerta o médico.
Fonte: Fantástico