Sem poder fazer pausas para fumar, Benedito de Oliveira, supervisor de operações da Johnson & Johnson, foi obrigado a diminuir o consumo e acabou largando o vício.
Os programas de combate ao fumo têm ganhado cada vez mais espaço dentro das empresas.
Os profissionais que se mantiveram adeptos ao cigarro, mesmo após a Lei Antifumo, em vigor há um ano em São Paulo e adotada também por outras cidades no país, estão com menos tempo e espaço para fumar dentro do horário de trabalho.
Apesar de não restringirem formalmente o período que o funcionário gasta com o cigarro, as companhias oferecem alternativas para que seus profissionais não comprometam o expediente e a produtividade com as pausas dedicadas ao fumo. Além disso, os programas têm o objetivo de melhorar a saúde e a qualidade de vida dos tabagistas.
Os investimentos têm sido feitos principalmente em programas de reposição de nicotina, terapia e na adoção de ambientes 100% livres de fumo. Para os especialistas ouvidos pelo Valor, essas alternativas evitam medidas mais duras, como o desconto do tempo que o profissional passa fumando no horário de trabalho.
Este é o caso de uma decisão recente do Conselho de Norfolk, no Reino Unido, que determinou que os funcionários de empresas locais sejam "descontados" pelo tempo que gastam fumando no trabalho.
Segundo Adriana Pereira de Carvalho, advogada da Aliança de Controle do Tabagismo, os pequenos intervalos para o cigarro não são previstos na legislação trabalhista brasileira, mas medidas radicais como a inglesa dificilmente funcionariam no país.
"Formalmente, o empregado com jornada acima de seis horas tem uma hora livre para refeição e descanso. Nesse período, o profissional pode fazer o que quiser, inclusive fumar."As pequenas pausas feitas durante o expediente, porém, mesmo não contempladas pela CLT, fazem parte da rotina dos trabalhadores.
Para Marcelo Santos, presidente da doers, consultoria de capital humano, é comum que profissionais do nível executivo façam pausas durante o dia para outras atividades não necessariamente relacionadas ao trabalho como conversar com colegas, tomar café ou usar a internet."Um gestor precisa observar a produtividade, os valores e a ética do seu funcionário. Tanto para chefes quanto para subordinados, é preciso ter consciência para evitar abusos."
Vera Colombo, técnica sanitarista da divisão de tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), afirma que é possível mensurar o impacto do tempo gasto com o cigarro na produtividade. "A cada semana, o profissional chega a perder quatro ou cinco horas de trabalho com as pausas para o fumo, o equivalente a, no mínimo, 10% da jornada. É um tempo importante para muitas organizações."
De acordo com Adriana Calvo, advogada especialista em direito do trabalho, as companhias deveriam investir em códigos de conduta para evitar que os fumantes se sintam perseguidos e os não fumantes sejam prejudicados pelo excesso de pausas dos colegas. "Se a empresa libera o funcionário para fumar, ela está tacitamente concordando em remunerá-lo por essa pausa. Isso pode gerar problemas internos de clima ou de produtividade.", afirma.
Na Petrobras, a solução encontrada foi criar uma tolerância de 32 horas a mais ou a menos, que o funcionário pode usar dentro de um mês. Se o colaborador for fumante, pode dedicar essas horas às pausas para o cigarro, sem interferência no salário. Por outro lado, o "banco de horas" poderia ser usado para negociar uma folga, por exemplo.
A empresa, que implementou em 2004 ambientes de trabalho livres de fumo e um convênio com o Ministério da Saúde para apoiar quem deseja largar o vício, obteve bons resultados com a medida. De 2004 a 2009, o índice de fumantes dentro da Petrobras caiu de 16% para 7,8% .
Para a advogada da Aliança de Controle do Tabagismo, é importante que as empresas encarem o tabagista de forma responsável. "Cigarro causa dependência. A ideia não é discriminar o fumante nem provocar desigualdade no dia a dia. Por isso a importância de programas de conscientização e apoio", diz.
Na Johnson & Johnson, que desde 2007 adota um ambiente de trabalho livre de tabaco, foram dois anos de adaptação dos funcionários fumantes até a retirada do último cinzeiro. Hoje não é permitido fumar nem mesmo nos estacionamentos da empresa.
"Começamos a transição em 2005, sempre levando em conta que não haveria discriminação mas restrição ao fumo", afirma a psicóloga Izabel Rivas, responsável pelo Programa de Assistência ao Empregado (PAE) da companhia.
A empresa oferece um tratamento de oito semanas aos funcionários e seus familiares. Mais de 400 pessoas já participaram do programa, que conta com reposição de nicotina e terapia. Atualmente, o índice de fumantes que conseguem parar após o tratamento é de 60%.
Dentre os que mantiveram o hábito, 80% passaram a fumar em menor quantidade do que faziam antes. "Quem fuma, precisou reduzir e se adaptar ao novo ambiente. Por outro lado, tivemos que fazer um esforço na empresa para entender quem não queria parar."
Desde a implementação do ambiente livre de fumo, o supervisor de operações de pessoal Benedito de Oliveira se viu obrigado a reduzir a quantidade de cigarros consumidos durante o dia. "Passei de quase um maço para oito cigarros", diz.
Após diminuir a quantidade, Oliveira foi convidado a participar do programa antitabagismo da empresa. A mulher dele, que não é funcionária, também se juntou ao grupo de apoio. Desde setembro do ano passado, o casal está longe do cigarro. Oliveira conta que a adaptação não foi tão difícil. "Eu já estava em um ambiente onde o cigarro não era permitido e só fumava na hora do almoço."
Em 2009, quando a Lei Antifumo entrou em vigor em São Paulo, o programa da Johnson & Johnson no combate ao cigarro virou referência para outras empresas. "Recebemos visitas de companhias querendo conhecer a estrutura da nossa política antitabagista para se inspirar. Transformamos nossa experiência em um manual para a implementação de ambientes livres de tabaco", afirma Izabel.
Fonte: Valor Econômico