Química. Ex-funcionários de fábrica em Paulínia, que teriam sido contaminados por substâncias químicas, aceitaram indenização menor que a inicialmente pedida e empresas se comprometeram a pagar assistência médica vitalícia; processo teve início em 2007.
A maior ação trabalhista em tramitação no Brasil está prestes a ser concluída, após seis anos de processo. As empresas Basf e Shell (atual Raízen) chegaram, ontem, pela primeira vez, a uma proposta de acordo com os ex-trabalhadores de uma fábrica de agrotóxicos de Paulínia, no interior de São Paulo.
A unidade já pertenceu às duas companhias e foi interditada em 2002 pelo Ministério do Trabalho, depois que análises na região constataram a presença de metais pesados no solo e em amostras de água subterrânea.
Ontem, no Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Brasília as empresas se comprometeram a analisar a proposta de pagamento de uma indenização de R$ 200 milhões por danos morais coletivos, aceita pelo Ministério Público do Trabalho.
Individualmente, cada um dos 1.068 ex-trabalhadores pode receber uma indenização de até R$ 180 mil, por danos morais e materiais - que somam cerca de R$ 170 milhões. Além disso, todos os trabalhadores e seus dependentes terão direito a um plano de saúde universal pelo resto da vida custeado pelas multinacionais. Esse é o maior valor de um acordo firmado no Tribunal Superior do Trabalho, caso ele seja aceito pelas multinacionais.
O acordo não foi assinado ontem porque todas as partes envolvidas ainda vão analisar a proposta. Os trabalhadores farão uma assembléia amanhã para aprovar os termos definidos em Brasília.
"É só uma formalidade, porque eles estão de acordo", diz o advogado Mauro Menezes, que atende dois sindicatos que reúnem os ex-funcionários. As duas empresas também levarão a proposta para avaliação de seus acionistas.
Todos têm até segunda-feira para dar um retorno definitivo. Outros 76 ex-trabalhadores que entraram com ações individuais na Justiça contra as empresas pedindo assistência médica poderão requerer o benefício em um prazo de 30 dias após a homologação.
Embora estejam prestes a chegar a um acordo com os trabalhadores, a Shell fez questão de ressaltar em nota que não há comprovação de nexo entre os danos causados à saúde dos ex-funcionários e a contaminação da área.
"A companhia entende, baseada em amplos estudos, que a ocorrência de contaminação ambiental não implicou, necessariamente, em exposição à saúde de pessoas", disse a Shell, em nota.
Indenizações. Dos R$ 200 milhões da indenização por dano coletivo, ficou acertado que R$ 50 milhões serão usados na construção de um hospital maternidade, equipado, que será doado ao município de Paulínia.
Os outros R$ 150 milhões serão pagos em parcelas de R$ 30 milhões anuais, destinados ao Centro de Referencia à Saúde do Trabalhador (Crest), em Campinas, e à Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro). Cada instituição receberá R$ 75 milhões.
A proposta de acordo assinada ontem ocorreu na quinta audiência de conciliação do caso conduzida pelo então presidente do TST, ministro João Oreste Dalazen, que se empenhou para colocar fim a um processo que tramita na Justiça há seis anos.
Dalazen passou o posto de presidente do tribunal ontem, logo após a audiência. A proposta final, no entanto, é bem inferior à que foi pleiteada pelo Ministério Público inicialmente, que girava em torno de R$ 622 milhões.
"É inacreditável. Essas companhias nunca aceitaram ser afrontadas por trabalhadores", diz Mauro Bandeira, de 60 anos, que de 1977 a 2002 trabalhou na Shell/Basf e hoje faz parte da Associação dos Trabalhadores Expostos a Substâncias Químicas (Atesq). "Quando decidimos lutar por aqueles que morreram ou que até hoje enfrentam problemas de saúde, acreditamos que um dia poderíamos vencer."
No ano de 2007, o Ministério Público do Trabalho ingressou com a ação civil pública contra as empresas pedindo o custeio de tratamento de saúde, além de indenização. Exames de saúde dos ex-trabalhadores comprovaram doenças como câncer e apontaram o elo entre a contaminação e as doenças.
"Esses trabalhadores ficaram expostos a mais de dez substâncias tóxicas que provocaram alterações genéticas", diz a procuradora regional do trabalho Adriane Reis de Araújo. Segundo ela, a proposta de acordo também representa um avanço para o direito trabalhista brasileiro. "A partir desse caso, não será mais preciso comprovar o nexo de causa em relação ao risco no manejo dessas substâncias, dando o direito ao trabalhador de pedir o tratamento."
Fonte: O Estado de São Paulo
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