O trabalho auxilia o Corpo de Bombeiros, que, ao chegar ao local das ocorrências, normalmente de difícil acesso, já encontra o trabalho parcialmente resolvido. Entre janeiro de 2008 e junho de 2010, a capital paulista teve 176 incêndios em favelas, de acordo com o Corpo de Bombeiros.
Autor do "programa de segurança contra incêndio em assentamentos urbanos", o engenheiro José Carlos Tomina, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), formou 65 brigadistas na favela. Eles receberam treinamento e um kit de equipamentos simples: dois extintores de pó químico seco, capacete, óculos, luvas, capa e botas.
O IPT renova periodicamente os equipamentos. "Nesta comunidade, desde então, nunca mais houve incêndio", afirma Tomina. "Depois desse curso, nunca mais teve incêndio na favela", diz a agente de saúde Sandra Lúcia Martins, de 49 anos, uma das coordenadoras da brigada.
Os brigadistas moram em diferentes pontos da favela, mas conhecem bem os nomes das ruas e becos estreitos em que sobram ligações irregulares de energia elétrica. Sempre que há um princípio de fogo eles são mobilizados aos gritos e chegam rapidamente ao local do acidente. "Tem lugar aqui que o bombeiro não entra", diz Sandra, mostrando corredores entre barracos intransponíveis.
A pedido do G1, Sandra reuniu alguns brigadistas da favela. Cada um deles tem uma função pré-determinada no grupo: alerta, combate, isolamento e acionamento dos bombeiros e rescaldo. Sandra reconhece que o grupo corre o risco de se dispersar por falta de reciclagem e também porque alguns moradores mudaram ou arrumaram emprego. "Ao todo, são 60 brigadistas, mas para achar todo mundo é difícil", diz ela.
Sandra apresenta os seguranças Gerson de Jesus Ponciano, de 30 anos, e Julio César Ponciano, de 36 anos, que atuam no combate ao fogo. Assim como Sandra, também são alertas as agentes de saúde Ivani Corrêa de Santana, de 28 anos, a dona de casa Eudildes Caetano dos Santos, de 46 anos, e o motorista de caminhão Eugênio Brasílio da Costa, de 31 anos. "A gente retira bujões, retira pessoas. Quando eles [bombeiros] chegam, já fizemos tudo. Todo mundo acha que é simples, mas depois que existe a gente percebe a importância", afirma Ponciano.
Histórias não faltam. Eles contam que há cerca de dois anos uma criança escondeu-se sob a cama e ateou fogo. Desesperada, a avó jogou o colchão em chamas no corredor que dava acesso ao barraco, mas ficou presa com os netos, cercada pelo fogo, dentro da moradia. Os brigadistas chegaram rapidamente e conseguiram controlar o incêndio antes da chegada dos bombeiros.
Em outra situação, uma criança colocou fogo na cortina do barraco. Na terceira, foi a mãe que saiu para ir ao posto e esqueceu a panela no fogo. Há também casos como um botijão de gás sob ameaça de explosão e da criança encontrada sob a cama para fugir de um incêndio.
Treinamento
Sandra diz que uma das moradoras aceitou fazer o curso e durante o treinamento chegou a chorar antes de dominar o medo das chamas. O treinamento dura cerca de 40 horas e envolve até o combate ao fogo em latões de combustível.
Na mesma época, foram treinadas brigadas na Vila da Paz (Zona Sul), Maria Cursi (Zona Leste), Jardim Jaqueline (Zona Oeste), Jardim Cabuçu (Zona Norte) e em um cortiço na Rua Sólon, no Bom Retiro, região central da cidade. "Os outros ainda continuam ativos, não têm reciclagem, mas ainda existem", afirma o engenheiro Tomina. De acordo com ele, o projeto poderia ser expandido depois para todas as favelas de São Paulo. "A ideia era dar continuidade, mas não ocorreu o que estava programado", diz.
O vereador Celso Jatene aguarda até hoje a regulamentação da lei 15.022, aprovada em novembro de 2009, que cria o programa de prevenção de incêndios em favelas do município. Sem a regulamentação, diz ele, a lei não pode entrar em vigor. "Muitos incêndios poderiam ter sido evitados se a lei já existisse", afirma.
Consultadas pelo G1, as secretarias de Habitação e das Subprefeituras não souberam informar sobre a continuidade do programa de combate a incêndios em favelas ou sobre a regulamentação da lei. A Secretaria Municipal de Segurança Urbana informou apenas que as ações de prevenção em áreas de risco são realizadas regularmente pela Defesa Civil.
Fonte: G1
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