No dia 24 de outubro, durante partida de futebol pelo Campeonato Espanhol, o atleta Miguel García sofreu uma parada cardíaca testemunhada por colegas, pelo público no estádio e por câmeras que ajudaram a divulgar a imagem de seu colapso súbito para o mundo. Em menos de um minuto, García foi atendido por médicos e ressuscitado, sobretudo, pelas compressões torácicas e desfibrilação precoce.
O episódio ocorreu poucos dias após a publicação das novas diretrizes de RCP (ressuscitação cardiopulmonar), que enfatizam a importância de ações como aquelas adotadas no socorro ao atleta espanhol. Difundidas mundialmente, as orientações guiam a atuação de socorristas leigos e profissionais em casos de PCR (parada cardiorrespiratória).
Em linhas gerais, o socorro deve seguir a Cadeia de Sobrevivência e seus cinco elos. O quinto e último elo, que ressalta o atendimento hospitalar, é uma das novidades do novo consenso, divulgado pelo ILCOR (Aliança Internacional dos Comitês de Ressuscitação) e ratificado em 18 de outubro por diretrizes de entidades como AHA (American Heart Association) e ERC (Conselho Europeu de Ressuscitação).
As novas orientações coincidem com as comemorações pelos 50 anos de RCP no mundo. Na comparação com o consenso de 2005, as mudanças são sucintas, mas fundamentais para aumentar o número de vidas salvas. O principal anúncio foi o de alteração na sequência ABC (que corresponde à verificação das vias aéreas, ventilação e compressão torácica), amplamente difundida, até então, nos cursos de Suporte Básico de Vida. As ações continuam as mesmas, mas a sua ordem foi alterada para CAB. Assim, o primeiro contato com a vítima de uma PCR será com compressões, que devem ser fortes e rápidas, minimizando interrupções e permitindo o retorno total do tórax.
Conforme a AHA, a mudança ocorreu porque a maioria das vítimas de PCR fora do hospital não recebe nenhuma manobra de RCP. Um obstáculo para a ação pode ser a sequência ABC, que inicia com os procedimentos que os socorristas acham mais difíceis.
Também as compressões torácicas são retardadas na ABC, o que traz importantes implicações, já que a maioria das PCRs em adultos possuem ritmo inicial de FV (Fibrilação Ventricular) ou TV (Taquicardia Ventricular) sem pulso - quadros que se beneficiam de compressões e desfibrilação precoce. Com isso, o protocolo de "ver, ouvir e sentir" foi substituído pela identificação de sinais de respiração inadequada ou ausente. Profissionais de saúde devem checar o pulso por, no máximo, 10 segundos.
Segundo o doutor em Cardiologia Sergio Timerman, membro do ILCOR e da AHA e diretor do LTSEC-INCOR (Laboratório de Treinamento e Simulação em Emergência Cardiovascular do Instituto do Coração), a simplificação das ações aumenta as chances do retorno à circulação espontânea e, portanto, de sobreviventes. Com o novo consenso, afirma Timerman, a expectativa é de salvar, anualmente, mais 100 mil pessoas na Europa e outras 70 mil nos Estados Unidos. No Brasil, proporcionalmente, o aumento no número de sobreviventes poderia chegar a 50 mil por ano.
A RCP Só-compressões começou a ser divulgada em março de 2008, com a publicação de parecer consultivo da AHA. Para Randal Fonseca, diretor da RTI (Rescue Training International) e instrutor do NSC (National Safety Council), é uma forma alternativa de o leigo iniciar o atendimento a vítimas de PCR testemunhada, enquanto aguarda a chegada de ajuda especializada.
O consenso de 2010 contempla também a possibilidade de profissionais de atendimento a emergências presentes na cena não terem meios ou não saberem aplicar as insuflações. Conforme Randal, tal perspectiva refere-se aos profissionais que não tripulam ambulâncias, como comissários de bordo, instrutores de atividades esportivas, guias de turismo e outros atores que, embora tenham responsabilidade implícita de atender vítimas, podem não estar treinados ou equipados para aplicar insuflações.
"É importante reiterar que, para os profissionais da saúde e de resgate, as novas diretrizes da AHA dão ênfase à importância de eles participarem de programas de treinamento para aprimorarem as técnicas e aplicarem a RCP completa. Para isso, a AHA recomenda que sejam intensificados os treinamentos para que sejam melhoradas continuamente a proficiência e habilidade de todos os profissionais que participam, em diferentes níveis, da corrente das chances de sobrevivência cardíaca", adverte.
A relação compressão/ventilação permanece em 30:2 (são 30 compressões em 18 segundos, seguidas por duas ventilações de um segundo cada uma). A RCP convencional, com a sequência ABC, ainda deve ser usada para atender vítimas de afogamento e outras causas de asfixia. Em crianças, segundo a AHA, apenas cerca de 5% a 15% das PCRs são atribuíveis a FV.
Fonte: Revista Emergência
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