Ao empregado doente deve ser resguardado o direito ao tratamento durante o contrato de trabalho até que se restabeleça. Assim se manifestou o juiz Antônio Carlos Rodrigues Filho, titular da Vara do Trabalho de Santa Luzia, ao julgar recentemente o caso de um empregado dispensado pouco depois de ter tido um surto psicótico na empresa.
Entendendo que o empregador não poderia dispensá-lo nessas condições, o magistrado decidiu declarar nulo o ato e restaurou a relação de emprego, suspendendo-a por falta de condições do reclamante para o trabalho, por razões médicas.
Segundo a empregadora, "o mal que aflige o empregado" não tem relação com suas atividades desenvolvidas na empresa. Por isso, ela entendia que ele poderia ser dispensado. Mesmo porque, conforme lembrou, o trabalhador não recebeu auxílio-doença acidentário. Mas para o juiz as coisas não se resolvem de forma tão simples assim.
É que uma perícia médica constatou que o trabalhador é portador de sofrimento mental com sintomas que apontam para psicose. De acordo com o perito, o reclamante adoeceu quando ainda trabalhava na empresa. No dia do exame inclusive ele não apresentava qualquer condição para o trabalho.
"Aos olhos da lei, o empregado que se encontra acometido de moléstia, ainda que de natureza não ocupacional, tem o legítimo direito de ver guarnecido e incólume o seu contrato de trabalho contra atos decorrentes do poder potestativo do empregador", registrou o julgador na sentença. Ele esclareceu que somente após o restabelecimento do trabalhador o empregador poderá avaliar sua capacidade para trabalhar. Isso só pode ser feito com a saúde perfeita.
Para o juiz, as regras de higiene, segurança e saúde do trabalhador se aplicam perfeitamente ao caso do processo. Ele considera que a aplicação do direito deve ser ágil e rápida, sob pena de não alcançar sua finalidade.
E mais importante que eventuais valores monetários em discussão é a própria vital necessidade de o empregado exercer suas atividades enquanto apto para tanto. Se a saúde do empregado está comprometida, a obrigação do empregador é encaminhá-lo para tratamento. Caso contrário, estará desprestigiando a figura do trabalhador, que tanto contribui ao empreendimento empresarial, ponderou o juiz.
No entender do magistrado, o ato da reclamada violou o princípio da dignidade da pessoa humana, adotado pela Constituição da República tanto como fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º, inciso III) como fim da ordem econômica (artigo 170 caput), "constituindo, enquanto princípio, ao lado do direito à vida, o núcleo essencial dos direitos humanos", frisou.A dispensa de empregado doente também contrariou outro fundamento do Estado de Direito, que é a valorização do trabalho (artigo 1º, inciso IV), conforme destacou o julgador:
"Valorização do trabalho humano e reconhecimento do ′valor social do trabalho′ consubstanciam cláusulas principiológicas que, a par de afirmarem a compatibilização conciliação e composição (entre capital e trabalho), portam em si evidentes potencialidades transformadoras. Em sua interação com os demais princípios contemplados no texto constitucional, expressam prevalência dos valores do trabalho na conformação da ordem econômica prevalência que José Afonso da Silva reporta como prioridade sobre os demais valores da economia de mercado. Poderão, contudo, e aí o temor de Raul Machado Horta se tanto induzido pela força do regime político, reproduzir atos, efetivos, suas potencialidades transformadoras".
Nesse contexto, o juiz sentenciante declarou nula a dispensa e determinou a reintegração do reclamante ao trabalho, mantendo a integridade do contrato de trabalho para todos os fins. A empregadora foi condenada a pagar salários vencidos e vincendos, 13º salário, férias acrescidas de um terço e FGTS, este na conta vinculada sem autorização para levantamento. A tomadora dos serviços foi responsabilizada subsidiariamente.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais
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