Borra de café no pratinho da planta impede que o mosquito da dengue deposite seus ovos, assim como a mistura de vinagre balsâmico, noz-moscada e ervas aromáticas, certo? Errado, segundo especialistas. Nem borra, nem vinagre, nem inhame. A epidemia de dengue e o pânico instalado nos locais mais afetados se tornaram o cenário perfeito para a popularização de receitas milagrosas, seja para manter o mosquito longe, seja para minimizar os sintomas dolorosos.
Os mais assustados podem perder tempo, dinheiro, vasos de planta e até a saúde acreditando no uso de repelentes caseiros e remédios naturais sem comprovação científica de eficácia. Desde o início da epidemia, uma série de e-mails circula pela rede afirmando os benefícios dessa ou daquela medida - várias com o nome de um pesquisador, biólogo ou médico para corroborar a indicação.
A Folha consultou especialistas para comentar as dicas mais populares. Todos afirmam que não dá para subestimar o Aedes aegypti. Desconfiar de milagres é o primeiro passo para afastar a doença.
Repelente caseiro
Esse é o mais recente dos e-mails que circulam na internet. Segundo a mensagem, é só preparar uma mistura com cânfora, cravo-da-índia e outros ingredientes e, "voilà", um repelente natural sem contra-indicações e bem mais em conta que os de farmácia. Porém, não funciona. Algumas pesquisas apontam que o cravo-da-índia tem ação anti-séptica, mas não repelente. "O repelente funciona porque é um remédio tóxico para o mosquito. Por isso, não deve ser usado continuamente, já que, em grandes quantidades, também pode prejudicar humanos. No entanto, não existe toxicidade na cânfora", explica a farmacoterapeuta e bioquímica Bárbara Furtado, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Própolis
Entre as receitas mais divulgadas na rede, está o uso de própolis de abelha. A substância teria o poder de eliminar o vírus da dengue do organismo contaminado, atuar como repelente e tratar febre e dor de cabeça. O e-mail explica que a própolis possui flavona e vitamina B, que, exaladas pelo suor, manteriam o mosquito afastado. De acordo com Furtado, da UFMG, a própolis possui característica de alimento. "Ela teria que atravessar muitas barreiras corporais sem ter suas moléculas alteradas para ser um repelente eficiente na pele", diz.
O médico sanitarista Antônio Sérgio da Fonseca, da Fiocruz (Fundação Osvaldo Cruz) é enfático ao afirmar que não existe droga capaz de eliminar o vírus nem de controlar as reações imunológicas. "É melhor dar preferência a barreiras físicas como calças compridas e meias", completa.
Complexo B
Tem efeito repelente, mas ainda não se sabe qual a dosagem, a forma de aplicação e a garantia de proteção que o complexo ofereceria. "Não existe confirmação científica concreta sobre o uso do complexo. Faltam informações sobre como, quando e quanto usar", afirma Fonseca, da Fiocruz. Existe o risco ainda de hipervitaminose para quem toma o complexo continuamente. E a vitamina só age no momento da transpiração. "Seriam necessárias quantidades enormes de vitamina para tornar o complexo B eficiente. E, ainda assim, não ficamos suados o tempo todo", afirma o médico infectologista Ivo Castelo Branco, do Núcleo de Medicina Tropical da UFC (Universidade Federal do Ceará) e consultor sobre a dengue para a Organização Mundial de Saúde.
Andiroba e citronela
Velas e infusores à base de óleos essenciais dessas plantas podem, de fato, manter o mosquito afastado. Segundo pesquisas já realizadas, o cheiro delas causa uma intoxicação nos insetos semelhante à ação dos inseticidas. Mas a eficácia se resume ao cômodo onde está acesa, se não houver correntes de ar no local nem portas ou janelas abertas. As velas também devem ser acesas durante o dia, já que o mosquito tem hábitos diurnos. "A citronela já é usada pelos setores de controle de zoonoses há alguns anos", confirma Furtado.
Fonte: Flávia Gianini / Folha de S.Paulo
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